A campanha “Janeiro Branco” foi criada em 2014 e em 2023 foi instituída como Lei Federal (14556/23) tornando-se um marco oficial no calendário brasileiro. Essa iniciativa começou em Uberlândia, tendo como idealizador o psicólogo Leonardo Abraão.
A Campanha tem por principal objetivo propor ações visando a prevenção do adoecimento mental, que pode levar ao adoecimento psíquico como a depressões em vários níveis, dos mais leves aos mais severos, muitas vezes trazendo serias consequências, levando a morte física ou psíquica se não nos atentarmos para a vida mental.
Neste ano, a campanha “Janeiro Branco” traz como tema: o que fazer pela saúde mental agora e sempre.

É comum no mês de janeiro traçarmos metas e fazermos reflexão sobre mudanças para recomeçar o ano com bons hábitos, entretanto, devemos nos lembrar que a mente não obedece comandos conscientes, somos fruto de uma história, carregamos um passado e marcas que ficam em nosso inconsciente que muitas vezes não nos permite mudar de hábitos tão facilmente e na maioria das vezes os hábitos que não são bons estão ligados a angustias, ansiedades que vem do nosso mundo interior. Neste sentido penso que janeiro é sim um marco para nos atentarmos para o passado, o presente e ter esperança no futuro. Digo isso no sentido de buscarmos fazer uma reflexão sobre como levamos a vida, ao que estamos dando importância, de janeiro a janeiro!
Em tempos de tecnologia avançada, somos cobrados a agir de forma rápida e a vida mental fica destinada ao tempo cronológico, sequencial, mensurável que se associa à finitude – Chronos – rei dos titãs que tudo devora, se perde a qualidade do tempo vivido, tempo de Kairós , filho de Zeus e de Tyche, deusa da prosperidade, que está associado a algo especial e oportuno, que acontece no instante valioso do presente, tempo que faz o acontecimento ser memorável em sua significância.

Nosso mestre Freud, fala da fruição como uma forma de liberar tensões psíquicas, o que permite a experiência de satisfação ou realização. A fruição pode estar ligada ao prazer imediato ou está relacionada ao prazer ligado a experiências criativas, ligada às artes. Se tivermos imbuídos da arte que o outro cria, estaremos cuidando da nossa saúde mental, podendo receber a arte dentro de nós como uma forma criativa de viver. arte no sentido de criatividade.
No artigo “Sobre a Transitoriedade” Freud nos fala sobre a difícil tarefa de contemplar a beleza que está fadada à extinção, tudo que é belo é transitório. Temos um desejo de imortalidade e talvez por este motivo, as telas, os celulares, os corpos que não envelhecem estão á favor do adoecimento psíquico. As experiências emocionais se perdem quando ao invés de, sentirmos, fotografamos ou filmamos uma cena. Muitas vezes, nem se sente o frio na barriga diante de um ator/atriz maravilhoso, o aparelho de celular se apresenta como forma de registrar para o futuro aquela cena, perdendo-se a oportunidade de eternizar dentro de nós aquela experiência emocional.
Observo as cartilhas e manuais de “como ser mãe” quando nasce um bebê. Essa é uma das formas de não entrar em contato com a angustia gerada pela bela e dolorosa experiência da maternidade. Quando as mães estão buscando vídeos, fórmulas mágicas estão perdendo a linda oportunidade de “estar com” seu bebê, oportunidade única que coloca distante a experiência daquele momento que ficará registrado na vida mental não só do bebê que está à espera de alguém que o humanize, e sim, da dupla mãe/bebê. As telas muitas vezes nos impedem de observar/sentir o essencial para cuidar a tempo de um ser que acaba de nascer, indefeso e necessitado do olhar atento.
Temos que lidar com o luto daquilo que é passageiro, como o exemplo do bebê, amamos com tanta intensidade que muitas vezes o impedimos de crescer e se desenvolver em toda sua potencialidade, os tornando reféns de nossos próprios desejos de imortalidade.
A psicanalise é uma ferramenta que para usarmos temos que tê-la afiada como os instrumentos cirúrgicos. Se não cuidarmos de nossa própria mente, não teremos como cuidar do outro. É preciso uma analise longa e profunda do analista, somos humanos e temos nossas feridas, em contato com nossas dores poderemos estar intimamente ligados a dor de quem nos procura, podendo assim promover uma vida plena de significados, concebendo que dores, dificuldades sempre existirão, o bem estar está ligado a poder “SER” o que se é em toda sua potencialidade, o que difere de “TER” tudo que desejamos!
Com esse breve texto, deixo a reflexão: cuidar da saúde mental, dos vínculos que temos de forma mais criativa pode nos levar a um futuro mais promissor como ser individual e também como seres inseridos numa sociedade, se nos sentirmos cuidados, as chances de cuidarmos serão promissoras. E tudo começa por aí: um bebê desde o ventre materno precisa do corpo e da mente de alguém para conter as necessidades biológicas e psíquicas, para que no futuro tenha a capacidade de cuidar-se e cuidar do outro, amar-se e amar ao próximo! Assim estaremos mais protegidos de adoecermos psiquicamente!

Maria Inês Alves
Psicanalista pela Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo e Membro fundador do GEP de Marília e região